BLOG ESPIRITUALIDADE E RELIGIOSIDADE. AUTOR: ÁLAZE GABRIEL GIFTED.
Disponível em http://espiritualidade-e-religiosidade.blogspot.com.br
Autoria:
1. Maria Antonieta Benko - Enfermeira. Técnico Especializado Nível Superior do Departamento de
Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São
Paulo – USP;
2. Maria Júlia Paes da Silva - Enfermeira. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem
Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo – USP.
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo verificar a
opinião dos docentes de enfermagem sobre a espiritualidade e a assistência
espiritual no ensino de graduação, identificando sua presença no ensino atual e
propondo aspectos para a sua abordagem junto aos alunos. Foram entrevistados 24
docentes durante o mês de novembro de 1994 e 95,8% responderam considerar o
homem um ser espiritual, citando diferentes maneiras de como essa dimensão
altera e influencia seu dia-a-dia; 66,6% referiram ser importante o ensino da
assistência espiritual na graduação. Frente a diversidade dos conceitos e
respostas ficou evidenciada a necessidade de reflexão conjunta.
Descritores: espiritualidade, assistência espiritual
"Ensino é o nosso modo próprio de viver e o
corpo é a expressão do espírito dentro do tempo". Leonardo Boff
INTRODUÇÃO
O conceito espiritualidade continua sem uma
definição aceita por todos, apesar de nos últimos anos encontramos cada vez
mais bibliografias e fóruns de discussão sobre o tema. Muitos profissionais de
saúde procuram estudar e implementar este conceito enquanto outros ainda são
céticos e acham que esta não é uma questão científica. A enfermagem sempre teve
na suas prática a preocupação de assistir o cliente nas suas necessidades
espirituais, porém tem tido dificuldade em diferenciar a espiritualidade dos
aspectos religiosos e psicossociais do indivíduo (ATKINSON & MURRAY, 1985;
DANIEL, 1983).
A tendência crescente da enfermagem em ver o
indivíduo numa perspectiva holística gera questionamentos sobre sua assistência
nessa dimensão. O preceito básico do holismo pe que o todo individual
(corpo, mente e espírito) é mais do que a soma de suas partes, essas dimensões
interagem e assim, tratando uma delas, as demais serão afetadas. Embora esta
interdependência exista, as intervenções de enfermagem são escolhidas e implementadas
segundo as alterações associadas a cada dimensão.
A dimensão espiritual é uma parte integrante do
indivíduo, sendo importante para os enfermeiros avaliá-la e nela intervir
quando necessário. Entretanto, essa dimensão deve ser diferenciada do aspecto
religioso do indivíduo e do seu comportamento psicossocial. Para diferenciar
esse aspecto é importante que hajam estudos que definam a espiritualidade
através de reflexões onde sua especificidade seja levada em conta.
Segundo DIAZ (1993), possivelmente a maior ameaça
para a ampla aceitação da saúde espiritual, como uma área de estudo legítima, é
o impacto do cientificismo nas disciplinas de saúde. A visão de mundo que
prevalece nas disciplinas de saúde tem raízes no empirismo e nas ciências
naturais, que tem como base metodológica, de alguma forma, o naturalismo (a
visão de que todos os fenômenos podem ser explicados com base nas leis e nas
causas naturais). Esse autor relembra que, de acordo com a metodologia
naturalista, a ciência nem confirma, nem nega questões metafísicas, tais como o
conceito de espiritualidade.
Em resumo, as metodologias científicas atualmente
são legitimamente fundamentadas no naturalismo metodológico; entretanto,
dando-se muita ênfase nessa visão de metodologia científica, existe o risco de
excluir outras epistemologias as quais podem servir de um legítimo ponto de
partida para o estudo das realidades espirituais. Consideramos que, talvez seja
a hora dos profissionais de enfermagem ajudarem a abrir esses caminhos para uma
nova epistemiologia, e que reconheçam a possibilidade de uma realidade
metafísica que não limita na verificação apenas por meios empíricos.
Enblem apud HANSEN (1993) mostrou que na literatura
da enfermagem, espiritualidade e religião são usadas como sinônimos, porém os
dois não tem necessariamente as mesmas características. Religião é uma crença
no sobrenatural ou numa força divina que tem poder sobre o universo e comanda a
adoração e a obediência, um código abrangente de ética e filosofia;
espiritualidade é uma qualidade mais ampla do que religião. Uma pessoa não tem
que pertencer a uma religião organizada para alcançar o espiritual. Podemos
definir espiritualidade como uma força unificadora que não tem como
propósito aumentar a vida de uma pessoa, mas facilitar seu desenvolvimento, dar
uma orientação à realidade na vida diária e um significado para a sua
existência, independente de sua profissão religiosa. (HANSEN, 1993)
De qualquer modo, parece mais fácil para os
enfermeiros discutir o aspecto espiritual quanto há uma doutrina religiosa
concreta e identificada, em vez de uma rede abstrata e obscura guiando essa
dimensão dos indivíduos. Pode parecer que, satisfazendo rituais associados a
uma religião particular, os enfermeiros estejam atendendo plenamente as necessidades
espirituais do cliente.
A formação do enfermeiro reforça a ênfase nessa
hipótese, provendo uma introdução superficial dos ritos e crenças religiosas na
maioria dos livros de fundamentos de enfermagem. A conseqüência disto, é que
conhecendo as práticas específicas de várias religiões, os enfermeiros
consideram entender a natureza espiritual dos indivíduos julgando-se
habilitados para atender as necessidades espirituais. O mesmo pode ser dito da
política hospitalar e de procedimentos como batismo, comunhão, dieta alimentar,
entre outros. (HANSEN, 1993)
Quando a dimensão espiritual é considerada apenas
no contexto religioso, as ações dos enfermeiros tornam-se padronizadas e não
necessariamente individualizadas para as necessidades do cliente. Essa maneira de
cuidar torna-se problemática quando o mesmo não é ligado a uma religião e nem
acredita em Deus, num ser supremo, ou mesmo quando a sua espiritualidade não
está ligada à prática da religião. Ao igualar a dimensão espiritual com a
prática de doutrinas religiosas, o enfermeiro pode estar reduzindo a dimensão
espiritual.
A dimensão espiritual pode, muitas vezes, ser
incorporada a dimensão psicossocial (mente) o que além de torná-la
superdimensionada, subordina-a às teorias psicossociais, que não contemplam totalmente
o aspecto abstrato, inerente à dimensão espiritual. A indefinição dessas
dimensões pode levar a uma rejeição da dimensão espiritual, uma vez que a
interpretação das necessidades psicossociais é fortemente influenciada pela
estreita relação da enfermagem cm a psiquiatria, que tem discutido o papel da
religiosidade no desenvolvimento de várias psicopatologias. Se a religiosidade
é percebida como parte de alterações psiquiátricas do cliente, a equipe reluta
em atender essas necessidades que envolvem aspectos da assistência espiritual
(HANSEN, 1993)
Por outro lado, os enfermeiros parecem considerar
esta área profundamente pessoal e por este motivo evitam intervir. Embora
relutar em discutir referências espirituais com os clientes, não seja o mesmo
que negar, o resultado é o mesmo, pois nas duas situações nenhuma identificação
clara desta dimensão é feita, como também nenhuma tentativa para a sua
compreensão.
Em resumo, a espiritualidade apesar de estar
estreitamente ligada à religião e à dimensão psicossocial do ser humano, é
diferente e única. Porém, o que a torna única não está bem elucidado. DANIEL
(1983); DIAZ (1993); HANSEN (1993) E ROBINSON (1994) são exemplos de estudiosos
que se preocupam em introduzir na área da saúde a espiritualidade como uma dimensão
legítima de estudo e pesquisa. Consideram que a falta de um consenso para a
definição da espiritualidade ou saúde espiritual deve ser visto como parte de
uma evolução normal de uma área de estudo nova e emergente não como uma
deficiência significativa.
A NANDA (North American Nursing Diagnosis
Association) é uma organização de enfermagem que desde 1982 tem buscado
identificar, validar e classificar as entidades clínicas nas quais o enfermeiro
intervem. Ela aborda diretamente o aspecto espiritualidade no padrão de
resposta humana VALORAR. Nesse padrão o único diagnóstico de enfermagem já
identificado e aceito para testes clínicos e o de "Angústia
Espiritual". Um conceito de espiritualidade emerge da definição desse
diagnóstico que é: "o princípio de vida o qual permeia todo o ser de uma
pessoa, íntegra e transcende sua natureza biológica e psicossocial"
(FARIAS et al, 1990).
Quando uma pessoa é confrontada com uma crise ou
doença, ela pode sentir ameaçada a sua totalidade pessoal e seu bem estar. Não faz
diferença a dimensão de vida que essa alteração atinge, porque o corpo, a mente
e o espírito estão unidos de forma que, o que afeta uma dimensão, afeta também
as outras. O sofrimento e a doença freqüentemente forçam a pessoa a encarar
assuntos relacionados ao significado da vida; face à uma situação de crise, ela
pode ser confrontada com a realidade de sua existência, relações consigo mesma,
com os outros, com Deus e talvez até com sua própria morte. Confrontada com
tais crises é que, segundo a NANDA (1989), a pessoa pode apresentar sinais de
angústia espiritual, pois, essas alterações colocam à sua vista a limitação a
que todo ser humano está sujeito.
Diante dos aspectos citados e pelo fato de estarmos
vivenciando a reformulação do currículo do curso de graduação da Escola de
Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP), várias questões a permearam,
entre elas a necessidade da enfermagem fundamental discutir a especificidade do
aspecto subjetivo (mente-espírito) e objetivo (corpo) do ser humano. Neste novo
enfoque, a espiritualidade é a dimensão menos estudada, pois além de não termos
um fórum específico de discussão sobre essa temática, ela é incorporada aos
outros aspectos de atendimento do paciente e não possui uma estrutura
conceitual desenvolvida no paradigma vigente.
Por não termos claro como o tema é concebido na
Escola de Enfermagem, achamos importante antes de redigir um texto básico para
o aluno, identificar a concepção da escola para que servisse de subsídios na
condução do tema. Motivadas para caracterizar alguns aspectos da
espiritualidade entre os docentes da instituição, e por considerarmos que esse
tema merece uma reflexão mais profunda, é que este estudo foi realizado, com os
objetivos expostos a seguir.
OBJETIVOS
- Verificar a opinião de docentes de enfermagem do
terceiro grau sobre o aspecto espiritualidade no ser humano.
- Verificar a importância deste item para esses
docentes no ensino de enfermagem e sua existência no ensino atual.
- Propor estratégias para abordagem da assistência
à dimensão espiritual junto aos alunos da graduação de enfermagem.
MATERIAL E MÉTODO
A população deste estudo foi constituída por 24
docentes alocados nos diferentes departamentos da EEUSP. Esse total equivale a
30% dos docentes da instituição e, essa mesma porcentagem foi mantida nos
quatro departamentos existentes. A escolha dos docentes foi aleatória
tomando-se apenas o cuidado de ter a representação de docentes de todas as
disciplinas dos diferentes departamentos.
A coleta de dados transcorreu durante a última
semana do mês de novembro de 1994, através da entrega do instrumento de coleta
de dados (anexo) par que o docente respondesse na hora, preferencialmente. As
autoras do presente trabalho é que coletaram pessoalmente as informações.
O instrumento de coleta de dados (Anexo I) constou
de sete questões que tiveram o intuito de ver o posicionamento pessoal do
docente frente ao tema espiritualidade a opinião a respeito do ensino dessa
temática.
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
Dos 24 docentes pesquisados, 17 (70,8%) referem ter
religião, sendo citada a religião católica por 12 deles (algumas praticantes,
outros não), 2 citaram o espiritismo, 1 a religião protestante, 1 a umbanda e 1
referiu que o significado de religião é estar religada a Deus e por isso não
tem seita específica. Sete (29,2%) referiram não ter religião alguma.
Quando questionados se o homem é um ser espiritual,
23 (95,8%) afirmaram que sim, tendo apenas um docente que considera o homem
como um ser não-espiritual. Isto, a nosso ver, configura um ambiente propício
para a discussão na EEUSP a respeito desse tema de forma que exista maior
esclarecimentos e coerência na abordagem do assunto junto aos alunos.
Ao serem indagados sobre a existência de
"coisas" espirituais importantes para si mesmo, vários questionaram o
que era "coisa" espiritual, sendo explicado que o objetivo das
autoras foi deixar a pergunta bastante ampla, permitindo que cada um se
posicionasse inclusive com relação ao que, eventualmente fosse "coisa"
espiritual para si. Dos 24 docentes, 21 (87,5%) afirmaram que existem
"coisas" espirituais importantes, um (1) respondeu "não
sei" e 2 responderam que não existem.
Citaram "coisas" espirituais importantes
sentimentos que vivenciam no dia-a-dia a e que identificam como sendo gerados
pelo fato do homem ser espiritualizado: solidariedade (3 citações), amor (2),
fé (2), respeito ao outro (2), alegria (1), harmonia (1). Outros docentes se
referiram a "coisas" espirituais, ligando-as com práticas ou rituais
religiosos como: prática de meditação (2), missa (1), oração (1), atuação em
comunidade cristã (1) e mesmo a discussão sobre temas como origem da vida e
transcendência. Também foram citados nessa questão Deus (4), a alma (3), Cristo
(1), Nossa Senhora (1) e a explicação de que todas as situações são permeadas
por "coisas" espirituais * .
Questionados sobre como essas "coisas"
espirituais os ajudam e em que situação, 11 dos docentes (45,8%), referiram que
em todas as situações do dia-a-dia, exemplificando que isso influi na forma de
se relacionem com as pessoas (alunos, família, pacientes, equipe) e pela
consciência de fazer parte de um todo universal. Outros 10 docentes (41,6%)
afirmaram que em algumas situações específicas essas "coisas" o
ajudam, por exemplo, nos momentos de stress, de estar diante de um fato novo
que demanda muita energia, nas situações "difíceis", de depressão, sofrimento,
conflitos, na compreensão da morte. Dois (2) docentes referiram que essas
"coisas" espirituais auxiliam no próprio desenvolvimento pessoal, e
um (1) que, na medida em que vamos nos ligando mais a Deus, o significado de
todas as "coisas", inclusive do que é espiritualidade, se modifica.
As opiniões apontam por um lado, para a importância
de não serem padronizados os conceitos e as expressões espirituais e, por
outro, nos dá a abrangência de como vários aspectos interagem/interferem com o
espiritual. A discussão sobre esses aspectos auxiliaria o docente no
desenvolvimento de uma linguagem comum que facilitasse o debate dessa temática
com o aluno - em campo ou em sala de aula - pois os próprios docentes afirmam
que essas "coisas" ajudam, de uma forma ou de outra, no quotidiano da
vida, na maneira de encará-la e vivê-la ou mesmo no próprio desenvolvimento
pessoal.
A definição do que é espírito segundo os docentes
entrevistados pode ser vista no quadro 1.
Pelo quadro 1 podemos perceber 8 referências
(33,3%), com sendo a essência do ser humano ("o que nos integra"); 7
(29,2%) como sendo "algo maior", diferente da alma, (algo etéreo, não
palpável, que transcende a matéria); 6 referências (25%), como sendo energia
("uma força que existe nos seres vivos, que vitaliza as pessoas"); 6
(25%) citam espírito como alma ou como algo que se desenvolve em várias vidas,
portanto imortal; 3 (12,5%) referindo ser algo sentido, um "pensar
interior que cresce em função da vivência" e se confunde com o "eu
interior", permitindo que se desenvolvam valores como respeito, humanidade
pessoal; 3 (12,5%) fazem referência ao aspecto ético que é desenvolvido quando
se cresce espiritualmente, pois influencia os sentimentos e comportamentos que
se têm com os outros e desenvolve-se os valores ligados a respeito e
humanidade; 2 responderam "não sei" e houve uma resposta afirmando
que espírito é estar em harmonia com a natureza e outra, algo que a maioria das
pessoas acredita. Essa diversificação na forma de caracterizar essa dimensão do
ser humano dificulta a especificação desse aspecto no atendimento de
enfermagem. Debates e discussões podem auxiliar os docentes a se sentirem mais
seguros, tornando possível o ensino do cuidado relativo à dimensão espiritual.
Com relação a importância do ensino da assistência
espiritual na Enfermagem, 16 (66,6%) consideram importante; 4 (16,6%) não
consideram importante e 4 (16,6%) não sabem se é importante essa discussão no
ensino. Dos que consideram este conteúdo importante, alguns justificam que ele
nos torna mais humanos; facilita a aproximação entre os indivíduos e torna a
assistência de enfermagem também mais humana.
Lembramos que apesar de toda a discussão filosófica
a respeito da definição de espiritualidade, a NANDA (1989) propões uma
definição que pode ser ponto de partida e que respeita a especificidade dessa
dimensão, possibilitando a aplicação do conceito na prática e conseqüentemente,
estudos dessa prática. Roteiros que avaliam a dimensão espiritual já foram desenvolvidos
por vários estudiosos do tema, entre eles podemos citar Stool apud McFARLAND;
McFARLANE (1989) que focaliza quatro aspectos específicos a serem pesquisados
no cliente: seu conceito de Deus ou Divindade; a fonte de sua força e
esperança; o significado das práticas e rituais religiosos e a relação
percebida entre as crenças espirituais e se estado de saúde. O'Brien apud
McFARLAND; McFARLANE (1989) considera que no atendimento do paciente é
necessário avaliar as crenças espirituais gerais, crenças espirituais pessoais,
identificação com a religião institucionalizada, sistemas e rituais de apoio
espiritual ou religioso e déficit ou angústia espiritual.
A possibilidade do paciente receber a assistência
espiritual em decorrência da avaliação por um instrumento adequado a esta
dimensão, juntamente com um profissional devidamente sensibilizado para esse
aspecto, são justificativas para o estudo desse tema, mesmo sem uma definição
amplamente aceita.
Por este aspecto da assistência de enfermagem mais
citado do que exercido, podemos inferir que isto dificulte o posicionamento do
docente no seu ensino. É importante salientar que 16,6% dos docentes não
consideram importante o seu ensino, o que a nosso ver, pode se tomar expressivo
se somarmos os outros 16% que referem não saber se é importante.
Sobre "como" ensinar, 8 referências
(33,3%) são relacionadas a reflexões junto ao aluno sobre: o que é
espiritualidade e sua importância, a necessidade de despertar no aluno esse
aspecto da vida; levantar suas crenças e valores a respeito desse assunto;
sensibilizá-lo a dar abertura para que o paciente manifeste esta necessidade,
pois este aspecto pode ser importante para o doente; desenvolver o respeito
pela espiritualidade do paciente; 3 docentes referiram temas relacionados a
religião: aulas teóricas sobre as mais variadas religiões, discussão com
pessoas de diferentes religiões; e, outros 3 sugeriram a discussão com o aluno
do ser humano numa visão holística e social (interacionista); conceitos
teóricos básicos sobre espiritualidade, rever os estudos já existentes na
enfermagem a respeito do tema, ou mesmo ter uma disciplina específica na
graduação sobre a questão do morrer e da morte e a assistência de enfermagem.
Dois (2) docentes, apesar de acharem importante o ensino desse conteúdo, não
saberiam como abordá-lo.
Dos outro quatro (4) docentes que responderam esta
questão afirmando não saber se este conteúdo deve ser abordado na EEUSP, um (1)
o considera importante na formação do enfermeiro; outro (1), que deve ser ministrado
se tiver ressonância direta na assistência de enfermagem; um (1) que a
espiritualidade não pode ser ensinada, pois é uma questão mais ampla, onde cada
um segue um caminho, tem um entendimento, uma vivência e, que o ensino talvez,
seja unir o conhecimento técnico-científico com o respeito ao outro; e um (1),
não tinha opinião formada a respeito.
Dos quatro (4) docentes que não acham importante o
ensino da assistência espiritual na EEUSP, 3 não justificaram o porquê e 1
docente explicou que este assunto já está incluído no tema comunicação e
"técnicas curativas internas" (exemplo, brinquedo para criança).
Quando questionado sobre o fato de abordar este
aspecto na própria disciplina ministrada, 15 (62,5%) dos docentes abordam esse
assunto e 9 (37,5%) não abordam. Dos que abordam, 10 (41,6%) referiram ser em
situação de campo de estágio, a partir de problemas identificados no paciente
ou no aluno; 7 (29,1%) consideram que abordam o tema através da própria postura
ou filosofia de vida; 2 em situações específicas, como discussão de batismo em
recém-nascido de alto risco e na visita pré-operatória. Dos 9 docentes que
afirmaram não abordar esse assunto, 4 acabaram citando situações que demonstram
que, na verdade, discutem a temática com os alunos de maneira informal, 3
quando surgem questionamento do aluno ou paciente, e 1 na assistência perinatal
e no nascimento.
DIAZ (1993) recomenda que o ensino do cuidado à
espiritualidade deve ter a precaução de não converter ou ter essa pretensão,
que deveria ser mais no sentido de guiar os estudantes ou clientes em direção
ao próprio entendimento e experiência pessoal, dentro de um paradigma da saúde
espiritual. Outro aspecto seria diferenciar entre religião e espiritualidade,
considerando como ponto principal, o fato de que espiritualidade nem exclui nem
é exclusivo do religioso. Goodle e Arriola apud DIAZ (1993) sugerem ainda, que
o educador de saúde tem que: primeiro reconhecer e respeitar a diversidade
cultural do estudante e a existência de uma estrutura de crença espiritual; e
segundo, reconhecer e respeitar a diversidade de percepções do estudante a
respeito de saúde e saúde espiritual.
DIAZ (1993) identifica três argumentos para
questionamentos que aparecem freqüentemente contra a abordagem da
espiritualidade no ensino e, contra argumenta afirmando ser uma área de ensino
necessária para os profissionais de saúde. O argumento contrário a ser uma
dimensão sem definição, ele contesta considerando como etapa do desenvolvimento
atual da temática e ser um problema próprio de um conhecimento emergente. Com
relação ao argumento de poder considerar a espiritualidade como dimensão
incorporada ao aspecto psicológico, aponta para o fato que este aspecto não
contempla a sua especificidade. Finalmente, a crítica de que o ensino da espiritualidade
é invasivo à separação formal Igreja-Estado, argumenta que a espiritualidade é
diferente de religião, que o objetivo não é a conversão do aluno a uma
determinada crença, mas que seja auxiliado na identificação de seu próprio
referencial teórico.
Esse mesmo autor considera importante que se
analise o aspecto de uma metodologia científica própria, onde seja respeitada a
dimensão metafísica do conhecimento em questão, pois é provável que estejamos
trabalhando com um paradigma ainda novo para o nosso atual conceito do que é
ciência (DIAZ, 1993).
A existência do diagnóstico de Angústia Espiritual
na classificação dos diagnósticos de enfermagem, é outro argumento forte para
que esta dimensão adquira a sua especificidade, para evitar erros de avaliação
e conseqüentemente, de intervenção de enfermagem.
Como conclusão do questionário, foi perguntado se
gostariam de registrar algo mais a respeito do assunto e 12 (50%) dos docentes
fizeram comentários relativos a: ensino-aprendizagem da espiritualidade (10
citações), complexidade do assunto (3) e abordagem desse aspecto junto ao
paciente (2). Por considerarmos ricas as reflexões feitas pelos docentes,
transcrevemos a seguir suas falas:
- Com
relação ao ensino-aprendizagem da espiritualidade:
"Caso fossem organizados grupos de discussão,
ou melhor, de reflexão, (não sei que modalidade), gostaria de estar
participando para o meu crescimento".
"Discutir sobre a palavra respeito ao que sou,
ao que o outro é, ou melhor, o que é santificar, ou seja, ser e ajudar o outro
a ser saudável, íntegro, isto é ser em Deus".
"Importante a iniciativa de começar uma
discussão a este respeito, porque o ensino não pode ser prescritivo e ao mesmo
tempo, não pode provocar vergonha de assumi-lo".
"Talvez fosse interessante um aprofundamento
dessas questões espirituais na EEUSP através de momento conjunto de reflexões
com pessoas capacitadas para tanto".
"Vejo a espiritualidade como um dos elementos
culturais de cada ser e portanto, uma abordagem a ela seria reconhecê-la, aceita-la,
permitir e facilitar sua expressão e nunca impor crenças ou receitas".
"Esse tema é imprescindível ao currículo de
graduação em enfermagem".
"Extremamente importante no curso de graduação
em enfermagem (essa temática)".
"Creio que a melhor estratégia seria a
discussão com pessoas de várias religiões e das mais diversas atuações na
prática".
"Espero que, algum dia, possamos ter a
espiritualidade como ponto de partida e não como fim".
"Acredito que espiritualidade e seu ensino não
fazem parte do conteúdo de ensino de enfermagem, reconhecendo que esse é um
aspecto que faz parte da necessidade de diversas pessoas; ele deve ser
levantado como problema de enfermagem, que a enfermagem em si não precisa e nem
tem condições de atender, mas pode encaminhar. Pode ser exercido entre
profissional e cliente que apresentem crença semelhante, mas não como prática
formal".
- Com
relação à complexidade do assunto:
"Sem dúvida nenhuma esse foi o questionário
mais difícil (que já respondi) por que não é fácil expressar estas
coisas".
"O assunto é muito complexo, não acredito ter
conseguido explorá-lo nestas questões".
"Achei muito difícil responder as questões
objetivamente".
- Com relação ao paciente:
"Dependendo da situação do paciente, essa pode
ser uma questão que tenha que ser lidada".
"Tenho tido oportunidade de trabalhar estes
aspectos, mesmo que parcialmente, com doentes, mais do que com aluno".
CONCLUSÃO
É indiscutível que a população de docentes da EEUSP
reconhece a dimensão espiritual do ser humano, assim como aspectos de
espiritualidade que interferem na sua vida, condições que, inegavelmente,
propiciam um ambiente adequado ao posicionamento dessa instituição com relação
ao tema.
Verificamos que 95,8% dos docentes acreditam que o
homem é um ser espiritual, citando diferentes maneiras sobre como essa dimensão
altera e influencia o seu dia-a-dia, desde no relacionamento com os outros e
com a natureza até no próprio auto-conhecimento; portanto, podemos afirmar que
a espiritualidade é importante para a população pesquisada.
Dezesseis docentes (66,6%), dos 24 entrevistados
consideram importante o ensino da assistência espiritual no curso de graduação
em enfermagem, justificando esse posicionamento com diversos argumentos e dando
sugestão de como esse ensino pode ocorrer. Dentre as propostas feitas podemos
citar: reflexões junto ao aluno sobre o que é espiritualidade e sua importância
para o homem; identificar suas crenças, valores sobre esse assunto, ministrar
aulas teóricas com um panorama das diferentes religiões, entre outras.
Quanto a existência desse tema no ensino atual, 15
docentes (62,5%) referiram abordar o assunto de diferentes formas: em campo de
estágio, através da própria postura ou filosofia de vida, em situações
específicas; porém dos 9 docentes (37,5%) que afirmaram não abordar o assunto,
4 citam situações informais que demonstram sua presença no ensino. Podemos
inferir, portanto, que 19 docentes (79,1%) abordam esse tema, sendo que nenhum
deles referiu um momento formal para a discussão desse assunto, o que nos leva
a crer que o mesmo é abordado de maneira assistemática e talvez não
instrumentalize o aluno.
Com relação ao terceiro objetivo do trabalho,
consideramos que a organização de um fórum de discussão sobre espiritualidade
possibilitaria aos docentes desenvolver uma terminologia comum que os
auxiliasse a expressar o assunto e a reflexão de estratégias para a sua
abordagem no ensino.
A assistência espiritual deve ter um momento formal
de ensino, onde pe necessário o cuidado para não se pregar a própria opinião
sobre o tema, mas direcionar os estudantes para seu próprio entendimento e
experiência pessoal, dentro de um paradigma de saúde espiritual. Uma abordagem
imparcial respeita e reconhece a diversidade cultural do estudante e a
existência de uma estrutura de crença espiritual. O docente pode (e deve)
utilizar o campo de estágio para detectar essas diferenças nos indivíduos,
estimulando o aluno a expressar suas dúvidas e percepções, pois desta forma,
ambos saem acrescidos, o paciente por não ter negado essa sua dimensão e o
aluno por refletir e clarificar esse aspecto mais sutil do atendimento.
Talvez, um dos grandes desafios da enfermagem seja
o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema, ajudando os profissionais de saúde
a abrirem caminhos para uma nova epistemiologia, que reconheça a possibilidade
de uma realidade metafísica e que não se limita a verificações somente por
meios empíricos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existe falta de clareza também na enfermagem sobre
o que é espiritualidade, religiosidade e assistência espiritual, fato que
limita os estudos sobre esse assunto.
Outro aspecto importante é que este tema provoca um
questionamento pessoal no enfermeiro com relação a sua base religiosa, sobre
sua concepção de homem e o sentido de vida; questões que geram conflitos
íntimos muitas vezes não conclusivos.
Consideramos que a espiritualidade no homem não se
relaciona apenas a momentos específicos de sua vida, (por exemplo, o momento de
morrer), mas envolve um posicionamento e uma reflexão pessoal sobre o próprio
significado da vida.
É necessária a discussão formal dessa temática no
ensino de graduação por que o objeto de trabalho da enfermagem é o ser humano
e, nossa visão de homem se origina no paradigma holístico - a compreensão do
homem como um ser bio-psico-sócio-espiritual. Utilizar as definições da NANDA
(1989) e testar os indicadores propostos para ela para detectar a
"Angústia Espiritual" do paciente pode ser um ponto de partida para
uniformizarmos esta linguagem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
01. ATKINSON, L. D.; MURRAY, M. E. Fundamentos
de enfermagem. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1985. Cap. 30: A
necessidade de espiritualidade.
02. DANIEL, L. F. Atitudes interpessoais em
enfermagem. São Paulo: EPU, 1983. Cap. 8: A assistência espiritual na
enfermagem.
03. DIAZ,
D. P. Foundations for spirituality: establishing the viability of spirituality
within the health disciplines. J. Health Educ., v. 24, n. 6, p. 324-26,
1993.
04.
FARIAS, J. N. et al. Diagnóstico
de enfermagem: uma
abordagem conceitual e prática. João Pessoa: Santa Marta,
1990.
05.
HANSEN, T. J. The spiritual dimension of individuals: conceptual development.
Nurs. Diagnosis, v. 4, n. 4, p. 140-46, 1993.
06.
McFARLAND, E. K.; McFARLANE, E. A. Nursing diagnosis and intervention.
St. Louis: Mosby, 1989. Cap. 11: Value belief pattern.
07. NORTH
AMERICAN NURSING DIAGNOSIS ASSOCIATION. Taxonamy I Revised 1989: with
official diagnostic categories. St. Louis: Mosby, 1989.
08.
ROBINSON, A. Spirituality and risk: toward an understanding. Holist Nurse Pract., v. 8, n. 2, p. 1-7, 1994.
ANEXO I - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
INICIAIS:
DEPTO:
DISCIP.
DATA___/___/___
DEPTO:
DISCIP.
DATA___/___/___
1. Você tem religião? ___Não ___Sim. Se sim, qual?
2. O homem é um ser espiritual? ___Não ___Sim.
3.
Existem coisas espirituais importantes para você? ___Não ___Sim
3.1. Se
existem, quais?
3.2. Elas
o ajudam? Em que situações?
4. O que é espírito?
5. Você acha importante o ensino
da assistência espiritual para a enfermagem?
___Não ___Sim. Se sim, como?
6. Você aborda esse aspecto na suas disciplina?
__Não __Sim. Se sim, como
7. Quer registrar algo mais a respeito desse
assunto?